Doença do Refluxo Gastro-esofágico (DRGE)
Fonte: Site da Federação Brasileira de
Gastroenterologia (FEBRASGO) www.fbg.org.br
Patrycia Araujo – Médica de Família do CMS Vila Canoas.
E-mail: patryciaa@yahoo.com.br
A Doença do Refluxo Gastro-esofágico (DRGE) se apresenta
como um conjunto de queixas que acompanha alterações no esôfago, resultantes do
refluxo (retorno) anormal do conteúdo estomacal, naturalmente ácido, para o
esôfago. O esôfago do adulto é um canal de 35 a 40 cm, que liga a boca ao
estômago. Ele é elástico. Na espessura de sua parede existem camadas musculares
recobertas internamente por uma delicada pele com o nome de mucosa, parecida
com o revestimento da boca. O início do esôfago fixa-se na parte inferior da
garganta, desce pelo mediastino, e cruza o diafragma através de um orifício
chamado hiato, poucos centímetros antes de se abrir no estômago. O mediastino é
a região entre os dois pulmões e o diafragma, e representa uma calota muscular
que divide o tórax do abdome. O esôfago tem ligamentos para o prender junto ao
hiato diafragmático e que contribuem para formar um tipo de válvula de retenção
para impedir o refluxo do conteúdo gástrico para o esôfago. Quando o esôfago
desliza para cima mais que 2 a 3 cm, traciona o estômago, e ambas as estruturas
se deslocam para o tórax. Decorre dessa alteração anatômica a Hérnia de Hiato
que, por sua vez, prejudica a válvula anti-refluxo. Quando o conteúdo do
estômago, em geral muito ácido, atinge a mucosa esofágica, este tecido reage
com um processo inflamatório, originando a Esofagite de Refluxo.
A causa mais comum de DRGE é a
incapacidade que tem o esfíncter
(válvula cárdia) inferior do esôfago de reter o
conteúdo do estômago, provocando a regurgitação. A Hérnia de Hiato, mesmo assintomática, é outro fator que pode
causar o refluxo. Acidez elevada, bem como excessiva produção de ácido
gástrico podem contribuir para a ocorrência da doença, além
de hipercalcemia e Colelitíase
(pedras na vesícula). Acrescenta-se
que a ingestão de alimentos condimentados, gordurosos, uso do fumo e álcool,
maus hábitos de alimentação, Obesidade, dormir logo após a refeição, e excesso
de comida nas refeições são fatores que ocasionam ou pioram os efeitos do
refluxo.
Azia/Pirose é a principal queixa, e raramente não ocorre.
Pode piorar, por exemplo, quando se dobra o peito sobre a barriga, ou quando se
deita com o estômago cheio. É referida como ardência ou queimação, correndo por
trás do esterno. A azia pode ser tão intensa como uma dor no peito, causando
impressão de infarto cardíaco. Pode ocorrer também um aumento da salivação, a
sialorréia, que é um reflexo natural, porque a deglutição dessa saliva alivia a
queimação, como se fosse um antiácido natural. A regurgitação é a percepção da
volta do conteúdo estomacal no sentido da boca, sem enjôo ou vômito,
freqüentemente com azedume ou amargor. Não raro determina tosse, pigarro e
alterações da voz e engasgo. A ocorrência de falta de ar com chiado no peito,
como a asma, pode ser desencadeada pelo refluxo. Sensações de bola na garganta,
desconforto ao engolir, fortes dores em aperto ou espasmos no meio do peito
representam uma desorganização das contrações faringo-esofágicas, responsáveis
por levarem ao estômago aquilo que ingerimos. Esses sintomas são considerados
complicações do refluxo, e levam o nome geral de dismotricidade esofágica. Dor
crônica no ouvido, náusea e sinusite também podem fazer
parte dos sintomas da DRGE.
Na criança, ainda no primeiro ano de vida, pode ocorrer um
refluxo gastro-esofágico excessivo, levando à devolução da mamada, engasgos,
choro excessivo e sono interrompido que, quando repetitivo, predispõe a
infecções e distúrbios respiratórios.
Entretanto, a ocorrência
eventual de pirose não significa um caso da doença, embora sua
ocorrência em períodos relativamente curtos seja indicativo de seu
desenvolvimento. Os sintomas de pirose e dor podem ser aliviados com a ingestão
de antiácidos. A
presença de bile refluída do duodeno parece ter
muita importância em um tipo mais grave de DRGE, chamado de Esôfago de Barrett, intimamente ligado ao câncer do
esôfago.
O relato do paciente adulto jovem pode levar ao diagnóstico,
sem necessidade de exames. A radiografia da transição esofagogástrica, enquanto
se deglute um contraste rádio-opaco, pode demonstrar tanto a hérnia, quanto o
refluxo.
A Endoscopia Digestiva Alta (EDA) é um exame para visualizar
o esôfago, estômago e duodeno, passando um fino feixe de fibras óticas através
da boca. A evolução da qualidade dos equipamentos, da eficiência da anestesia
local da garganta, a eficácia e a segurança da sedação do paciente tornaram a
endoscopia um exame simplificado. Além disso, pode ser repetida para controle
dos resultados do tratamento e, mais recentemente, para procedimentos
terapêuticos especiais. Uma tela recebe e amplifica com nitidez as imagens das
áreas sob inspeção direta, permitindo também fotos e filmes para reexaminar os
achados. Pode mostrar a incompetência da válvula de retenção gastro-esofágica e
a hérnia de hiato. O mais importante é que permite ver manchas vermelhas,
placas esbranquiçadas e úlceras, principalmente na mucosa do esôfago inferior,
sugestivas de graus variados da Esofagite de Refluxo. A endoscopia facilita a
coleta de material destas lesões para exame histopatológico, no qual se pode
definir a inflamação, avaliar um potencial cancerígeno e até diagnosticar o
câncer.
A Cintilografia do trânsito esôfago-gástrico é um método que
tem sido usado mais na criança em que se administra uma mamadeira normal,
contendo uma quantidade inofensiva de substância radioativa. A cintilografia
capta e registra imagens da radioatividade descendo para o estômago, ou do
estômago refluindo para o esôfago. É uma metodologia não invasiva, indolor e
ambulatorial. Entretanto, nem sempre capta o refluxo, pois este não é
permanente.
O estudo da pressão interna ao longo do esôfago
(Manometria), assim como a verificação do refluxo da acidez do estômago para o
esôfago (pHmetria de 24 horas) detectam variações naturais e anormalidades
capazes de diagnosticar a DRGE. São métodos que chegaram à rotina clínica há
relativamente poucos anos. Precisam ser usados quando os demais têm resultados
insatisfatórios, e para estudar parâmetros antes e depois do eventual
tratamento cirúrgico da doença do refluxo.
Em geral, o tratamento é clínico, com medidas educativas
associadas aos medicamentos. A vídeolaparoscopia vem facilitando o método
cirúrgico, aplicado a casos selecionados, com resultados muito bons.
Além de combater a obesidade, é importante evitar grandes
volumes às refeições, e de deitar nas primeiras duas horas seguintes. Algumas
pessoas beneficiam-se de dormir numa cama elevada pelos pés da cabeceira, em 20
a 25 cm. Outras, não se adaptam à posição, incham os pés, doem as costas, etc.
Há controvérsias sobre restrição de diversos alimentos. Ajudam no controle dos
sintomas algumas medidas como: evitar a bebida alcoólica, não deglutir líquidos
muito quentes, ingerir um mínimo de líquidos durante ou logo após as refeições,
evitar a ingestão de chá preto e café puro com estômago vazio.
Os medicamentos mais usados são os que diminuem o grau da
acidez no estômago e aqueles que inibem a produção de ácido pelas células do
estômago. Outros remédios de um grupo chamado de pró-cinéticos destinam-se a
facilitar o esvaziamento do conteúdo estomacal para o intestino, minimizando a
quantidade capaz de refluir para o esôfago. Uma queixa importante dos pacientes
é a recidiva dos sintomas, particularmente da azia, poucos dias após o término
dos medicamentos. Nesse momento, surge a questão do tratamento por tempo
indeterminado ou do tratamento cirúrgico. Vale dizer que o tratamento clínico
combate muito bem os sintomas, mas não modifica a hérnia hiatal e, poucas
vezes, muda o refluxo gastro-esofágico propriamente dito. Para os casos
mais graves e aqueles que não respondem ao tratamento clínico, pode estar
indicado o tratamento cirúrgico, que
consiste na correção da hérnia de hiato ou da incontinência do esfíncter
inferior do esôfago, através da confecção de uma válvula anti-refluxo
(fundoplicatura) com o fundo gástrico, que envolve total ou parcialmente o
esôfago. As vias de abordagens são a laparotomia
(método tradicional, com um corte vertical de cerca de 10-15 cm acima da
cicatriz umbilical), ou a laparoscopia
(método mais recente em que são realizadas 4 ou 5 pequenas incisões, de cerca
de 1 cm cada, por onde são inseridos o instrumental cirúrgico e uma pequena
câmera de vídeo). Recentemente foi aprovada a técnica endoscópica,
trans-oral, para a correção do refluxo.
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